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Fome no Brasil: Contraste entre potência agrícola e insegurança alimentar

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O Brasil está entre os maiores produtores agrícolas do planeta, colhendo safras recordes e dominando o mercado internacional com produtos como soja, café, carnes e açúcar. Mesmo assim, milhões de brasileiros convivem com a fome diariamente.

Segundo dados mais recentes da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura), entre 2021 e 2023, cerca de 8,4 milhões de pessoas passaram fome no Brasil — o equivalente a 3,9% da população. Esses números mantêm o país, desde 2021, no Mapa da Fome da ONU, do qual havia saído em 2014.

Apesar de uma leve melhora em relação ao triênio anterior (2020–2022), quando a fome atingia 4,2% da população, o problema persiste e levanta questões sobre as causas desse paradoxo em uma das maiores potências agropecuárias do mundo.

Por que a fome persiste em um país que produz tanto?

1. Falta de acesso financeiro, não de alimentos

Especialistas apontam que a principal barreira ao combate à fome no Brasil não é a escassez de alimentos, mas sim a falta de renda para comprá-los. Mesmo com a redução do desemprego nos últimos anos, o aumento dos preços dos alimentos tem superado os reajustes salariais.

2. Exportação em detrimento do abastecimento interno

Há críticas de que o agronegócio brasileiro está mais voltado para a exportação do que para suprir o mercado interno. Esse desequilíbrio, segundo alguns analistas, pode comprometer a segurança alimentar da população brasileira no futuro.

3. Modelo agropecuário dividido

Outros especialistas discordam dessa visão e acreditam que o modelo atual é capaz de atender tanto o mercado interno quanto o externo. Para eles, aumentar a produção agrícola, por si só, não resolve o problema da fome.

4. Efeitos das mudanças climáticas

A crise climática também foi citada como um risco crescente para o abastecimento de alimentos. A variabilidade do clima afeta diretamente colheitas e o fornecimento de produtos básicos.

5. Existência de desertos alimentares

Ainda há regiões do Brasil com acesso limitado a alimentos frescos e nutritivos, como frutas, legumes e verduras. Esses locais são conhecidos como “desertos alimentares”, e estão presentes em áreas urbanas e rurais.

Um exemplo foi documentado em março deste ano, quando uma equipe visitou um município do Piauí que sofria com a escassez de alimentos saudáveis. A solução encontrada pela comunidade foi investir no cultivo local de hortaliças, que melhorou a alimentação de várias famílias e reduziu a insegurança alimentar.

Caminhos para combater a fome: renda, emprego e políticas públicas

O ex-diretor-geral da FAO e ex-coordenador do programa Fome Zero, José Graziano da Silva, enfatiza que a fome no Brasil é um problema em larga escala e exige soluções estruturais, como a geração de empregos e a valorização da renda.

Segundo ele, ninguém sobrevive com menos que um salário mínimo, e políticas públicas voltadas à inclusão social foram essenciais para que o país saísse do Mapa da Fome em 2014. Entre essas ações estavam a valorização do salário mínimo, a criação do Bolsa Família e os incentivos à agricultura familiar.

Graziano associa a volta da fome à deterioração dos indicadores econômicos após a crise de 2014-2016, agravada pela pandemia, e ao enfraquecimento de políticas de segurança alimentar nos governos subsequentes.

Ele destaca a importância de programas como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) — que compra produtos da agricultura familiar para distribuição em escolas, hospitais e comunidades vulneráveis — e a merenda escolar como ferramentas essenciais no combate à insegurança alimentar.

produção farta, mas distribuição desigual

Mesmo com todo o potencial agrícola, o Brasil enfrenta um cenário preocupante em relação à fome e à insegurança alimentar. O desafio está menos na produção e mais na forma como a comida é distribuída e acessada pela população. Combater a fome no país exige um conjunto de políticas públicas, acesso à renda e o fortalecimento da agricultura familiar para garantir comida no prato de todos os brasileiros.

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